sábado, 18 de janeiro de 2014

À descoberta de bom Fado em Paris (to be continued...)

Temos andado em busca de um bom local para ouvir fado em Paris. Ao contrário do que o Rúben Alves possa fazer pensar, não é assim tão fácil de encontrar.

Numa das nossas pesquisas, surgiu o restaurante português L'Arganier, na Rue Edouard Jacques, que apresenta uma noite de fados todas as sextas-feiras.
Não encontrámos críticas positivas nem negativas, mas decidimos experimentar, ainda assim, por nossa conta e risco.
Saímos de casa animados, com o coração preparado para as grandes emoções que nos provocam habitualmente as tradições do nosso país.

Chegámos ao restaurante às 19:30, cumprindo as indicações da proprietária, e ficámos um pouco surpreendidos ao encontrar a sala vazia e com demasiada luz, para uma casa de fados. A vantagem foi podermos escolher a nossa mesa sem limitações, o que nos permitiu ficarmos colocados com vista privilegiada para o local onde os artistas atuariam, mais tarde.
À portuguesa, a proprietária foi tagarelando connosco, únicos clientes da sala, enquanto nos apresentava a lista, para que fizéssemos as nossas escolhas. Num menu um pouco reduzido e sem qualquer tradução para português (haja orgulho nacional!), encontrámos vários pratos típicos da nossa cozinha, que nos deixaram expectantes em relação à refeição. Lá nos decidimos a pedir, ainda um pouco desconfortáveis por nos encontrarmos sozinhos:  bolinhos de bacalhau como entrada e, como pratos principais, polvo à lagareiro e espetada de boi à moda da Madeira.
Ainda antes de começarmos a refeição, os restantes clientes foram chegando e rapidamente o L'Arganier tinha casa cheia; de conterrâneos, mas também de franceses, curiosos por ouvir ao vivo essa melodia lusitana. Assim, repleto de clientes, o restaurante ganhou outra vida, estabelecendo ainda um ambiente familiar, mas tornando-se bastante mais acolhedor.
A comida chegou à mesa com cheirinho a Portugal, matando algumas das saudades que trazemos dos nossos sabores: o bacalhau, a chouriça, o polvo, que não se encontram por aqui com a mesma facilidade, nem com o mesmo sabor.

Perto das 21h, os músicos começaram a preparar-se, iniciando o serão com um instrumental a guitarra e viola. Depois, aproximou-se deles o Sr. Sousa Santos, vestido a rigor, apresentando as noites de fado do L'Arganier, que ele próprio organiza, como se de grandes eventos musicais se tratassem, com direito a artistas convidados e grandes surpresas ao longo da noite. Autopublicitou-se, depois, como grande fadista, que teve "inclusivé a oportunidade de fazer a primeira parte de vários espetáculos da grande Amália Rodrigues, paz à sua alma!" Com tão presunçosa apresentação, seria talvez de esperar que o Sr. Sousa Santos se revelasse um artista de mão cheia, esquecido, por alguma desventura, neste pequeno restaurante do coração de Paris.

Falso alarme! O Sr. Sousa Santos canta o fado com aceitável afinação e com sentimento, sem dúvida, mas não é um fadista que encha as medidas a quem quer que seja. Esperamos, em vão, que a sua convidada, apresentada por ele com idêntico entusiasmo, viesse subir a fasquia. Mas a convidada, apesar de afinada também, parecia ter aprendido que cantar fado se resume a tremelicar a voz e a puxá-la lá bem do fundo, tornando-a excessivamente grave.
A seguir veio a Daniela, que o Sr. Sousa Santos apresentou, com alguma emoção, como alguém a quem um dia ele tinha dado a oportunidade de cantar o fado, considerando-a, portanto, sua afilhada. A Daniela já não trabalha com o Sr. Sousa Santos, mas, aparentemente, é convidada a cantar, sempre que se apresenta no L'Arganier. Apesar de ter uma voz doce e melodiosa, a Daniela grita fado, aqui e ali, e desafina um pouco além do que poderia passar despercebido.

E, depois da Daniela, aconteceu uma sucessão de atuações (algumas um pouco dolorosas!), não de artistas, mas de amigos do Sr. Sousa Santos, que gentilmente os apresentou como fadistas.
Não são fadistas; tenho mesmo alguma dificuldade em reconhecer o próprio Sr. Sousa Santos como fadista. Na verdade, apenas os guitarristas me pareceram realmente profissionais e, esses sim, fizeram o espetáculo valer a pena! Quanto ao resto, senti-me como se me tivesse encontrado no meio de um grupo de amigos que se juntou para passar uma soirée agradável, entre fados e guitarradas... e paga a peso de ouro!

Mentiria se dissesse que não nos divertimos ou que o ambiente foi desagradável: afinal, passámos o serão no meio de muitos portugueses bem dispostos e afáveis.
Mas, tendo pago (e bem!) um espetáculo de fado, confesso que não esperei passar a noite a pensar que a "Rua do Capelão" não tem comparação na voz da uma grande amiga minha, que o "Foi Deus" afinado de uma outra me impressionaria ainda mais nessa noite ou que a minha irmã dá toda uma outra graça à "Júlia Florista".

A busca de um bom Fado em Paris lá terá de continuar...

3 comentários:

  1. E lá vão duas lágrimas... A descrição é linda. Beijinho com saudade...

    ResponderEliminar
  2. Ahahahahahaha chegou uma altura do texto que pensei que irias dizer que ainda apareceu por lá o rouxinol faduncho :P

    ResponderEliminar
  3. HAHA! Bem, ao menos n te podes queixar de falta de variedade no que concerne aos "artistas". Mas dito isto,mais uma vez se vê que quantidade não é sinónimo de qualidade. Beijinhos minha loirita

    ResponderEliminar