sexta-feira, 21 de março de 2014

Don Giovanni

Ontem voltámos a ser presenteados com convites para a ante-estreia de uma ópera em Paris: desta vez, foi o Don Giovanni, interpretado pelos cantores do Atelier Lírico da Ópera Nacional de Paris.

Numa encenação modernizada desta obra de Mozart com mais de 200 anos, os artistas entraram em palco para maravilhar a audiência. No papel principal, o jovem Tiago Matos, interpretando de forma agressiva e até um pouco desprezível um divertido Don Giovanni, destemido e sem escrúpulos, obcecado pela sua lista de conquistas, que o seu pobre servo Leporello, representado de forma bastante cómica por Andriy Gnatiuk, vai registando.
As conquistas de Don Giovanni, que serão a sua desgraça, pisaram o palco de forma igualmente determinada, trazendo novos elementos à peça. Yun Jung Choi, no papel de Donna Anna, brinda o público com a sua delicadeza, provocando solidariedade com o seu sofrimento, que se vê vingado no final da peça. A seu lado, Élodie Hache interpreta uma Donna Elvira amargurada, que oscila entre a paixão que o conquistador provoca em si e o desejo de evitar que mais corações sejam partidos por ele; é esta ambição que a motiva a prevenir a ingénua Zerlina do que a espera, se cair nos braços de Don Giovanni.
Cruzam ainda o palco Damien Pass, no papel do jovem de orgulho ferido Masetto; Ugo Rebec, que representa o Commandeur, que voltará após a morte para levar Don Giovanni até às profundezas do Inferno; e ainda o português João Pedro Cabral, numa interpretação fantástica de Don Ottavio, noivo de Donna Anna, que se esforça por vingar o seu sofrimento e dar a Don Giovanni o destino que merece. João Pedro Cabral forma, com Yun Jung Choi, um casal extremamente expressivo, que faz o público sentir a angústia das suas personagens, não apenas através das palavras, mas da própria voz e, sobretudo, das expressões corporais e faciais.

O nosso modesto Don Giovanni esqueceu-se de referir, quando nos convidou, que interpretaria o papel principal nesta nova produção. Foi uma surpresa para nós, não só vê-lo interpretar o mais famoso dos quebra-corações, como assistir à forma brilhante como o fez. Ao longo da peça, o Tiago consegue criar no público um misto de sentimentos, que flutuam entre o amor e o ódio. Se, por um lado, faz da sua personagem um ser repugnante pelo seu egoísmo, a sua falta de caráter e a falta de respeito com que trata as mulheres; por outro, o humor e a ironia com que vai apresentando o seu Don Giovanni fazem com que a audiência desenvolva uma certa simpatia pela personagem, chegando-se mesmo a sentir pena deste sedutor profissional, quando chega o seu fim.

Don Giovanni estará em cena até ao final do mês, no MC93, em Bobigny. Vale mesmo a pena espreitar!

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